
14 Out Bluecomotive Talks: Entrevista a Yazz Ahmed
«Percebi que aquela música me soava diferente, mais autêntica»
Ansiosa pelo regresso a palcos portugueses — para partilhar histórias de sereias, cantos de sirenes, contos dos pescadores de pérolas, tempestades, músicas e danças festivas —, a trompetista e compositora Yazz Ahmed fala-nos do seu novo álbum, “A Paradise in the Hold”. Estas canções que captam os sons e as memórias da sua infância no Bahrein serão apresentadas ao vivo já a 16 de outubro, no Jazz ao Centro (Coimbra) e, no dia seguinte, no Seixal Jazz.
Assume que este novo álbum é um reflexo da forma como a sua identidade tem vindo a evoluir. Para quem está a conectar-se com o seu trabalho e sonoridade pela primeira vez, como descreveria essa evolução?
Comecei a aprender trompete dentro da tradição clássica ocidental, mas logo depois passei a investigar e a estudar o jazz americano, concluindo o meu mestrado em 2006. No entanto, tocar essa música não me parecia autêntico e não me sentia realizada criativamente. Durante esse período, mantive a minha herança bareinita escondida e inexplorada do ponto de vista musical. Então, em 2008, tive uma revelação ao descobrir o álbum “Blue Camel”, de Rabih Abou-Khalil, o músico libanês de oud. Esse trabalho combinava a sensibilidade do jazz com escalas e ritmos árabes, e contava com a participação do meu trompetista favorito, Kenny Wheeler. Foi como se uma luz se acendesse — percebi que aquela música me soava diferente, mais autêntica. Decidi então começar a experimentar a incorporação de escalas e ritmos árabes nas composições que estava a criar. O meu álbum de estreia, “Finding My Home” (2011) contém algumas dessas peças e marca o ponto de partida da viagem que tenho feito nos últimos 15 anos. Nos últimos 10 anos, adicionei também outros elementos à paleta das minhas ferramentas composicionais, como eletrónica em tempo real, gravações de campo manipuladas e uma espécie de energia livre e selvagem, em contraste com as técnicas composicionais mais elaboradas que sempre adorei.
O título do álbum, “A Paradise in the Hold”, é intrigante. Que imagens ou ideias evoca para si, e de que forma se liga à música?
O título parte da canção “My Ship”, de Kurt Weill e Ira Gershwin. Os versos iniciais da letra ressoam com uma das principais influências que exploro no álbum: as canções entoadas pelos mergulhadores de pérolas do Bahrein, que muitas vezes descrevem as suas jornadas heroicas de regresso a casa com uma carga preciosa.
My ship has sails that are made of silk,
The decks are trimmed with gold,
And of jam and spice there’s a paradise in the hold.
My ship’s aglow with a million pearls…
Na sua música tem frequentemente explorado o caminho da descoberta e da afirmação da sua identidade cultural. Com estas novas composições, inspiradas por uma viagem às suas origens no Bahrein, sente que essa ligação se aprofundou, que a música carrega agora um sentimento de “casa” ainda mais forte?
Sim, este é um projeto muito mais pessoal para mim. Enquanto a minha exploração da música árabe começou de forma académica, este álbum ressoa profundamente comigo, pois capta os sons e as memórias da minha infância. Há até uma faixa que inclui o meu pai e as minhas tias a fazer ululações e a conversar durante uma sessão de gravação na casa da minha família, no Bahrein.
“A grande sacerdotisa do jazz árabe psicadélico” — um título poderoso e evocativo. Como se sente em relação a essa designação: é um peso, um elogio, ou talvez um pouco de ambos?
Na verdade, o termo surgiu numa crítica de um jornalista a um concerto que dei na Argélia, por isso interpretei-o como um elogio ou uma aprovação da música que apresento, e desde então mantive essa descrição para o género que tenho vindo a desenvolver ao longo dos anos. E, como sou naturalmente tímida, tem sido bastante útil adotar o nome dessa personagem como persona de palco quando estou a tocar, em vez de me deixar dominar pela minha crítica interior, La Saboteuse.
De regresso aos palcos portugueses, que tipo de energia, histórias ou emoções espera partilhar com o público desta vez?
Sempre me senti muito bem-vinda em Portugal e tenho a sensação de que o público estabelece uma ligação forte com a música, como se compreendesse as emoções por detrás do que componho. As pessoas têm percebido que um dos temas a que volto repetidamente na minha música é o mar e a noite; talvez, por se tratar de um país à beira do oceano, haja algo que as atraia para o meu trabalho. Estou realmente ansiosa pelo meu regresso, para partilhar histórias de sereias, cantos de sirenes, contos dos pescadores de pérolas, tempestades, e músicas e danças festivas.
MAIS INFORMAÇÕES:
16 OUT
COIMBRA | JAZZ AO CENTRO
CONVENTO SÃO FRANCISCO
21:30
Bilhetes: 10,00 €
17 OUT
SEIXAL | SEIXAL JAZZ
FÓRUM CULTURAL
22:00
Bilhetes: 12,00 €